O médico Geraldo Alckmin (PSDB) parecia preocupado:
queria ser apenas um figurante na inauguração de
um hospital da Prefeitura de São Paulo para tratamento de Covid, instalado justamente na universidade onde ele é
professor.
Porém, Ricardo Nunes (MDB), vice-prefeito de da capital, atrapalhou os planos do ex-governador. “Este
hospital é uma contribuição de amor. Quando eu falo de amor, eu lembro do senhor,
querido Geraldo Alckmin”, declarou Nunes, procurando Alckmin na aglomeração e o
tirando do anonimato.
Alckmin evitou posar para as fotos da placa inaugural,
mas era tarde demais. Ele havia sido anunciado como “o nosso sempre governador
de São Paulo”.
Tucanos em extinção ou Alckmistas que estão
voltando?
Em fevereiro de 2019, o ex-deputado Pedro Tobias
renunciava ao cargo de presidente do PSDB paulista dizendo que “não agradava à
cúpula” dos novos tucanos. Isto é, Bruno Covas e João Doria. Também
reclamava que o partido tinha se tornado uma “zorra total”.
Desde então, Tobias é o principal porta-voz do
núcleo de oposição a João Doria no PSDB. Este núcleo é formado por tucanos
tradicionais que querem Geraldo Alckmin pela quarta vez no Palácio dos
Bandeirantes.
Eles contrariam um suposto desejo de João Doria de
transmitir o poder ao seu vice, Rodrigo Garcia, filiado ao DEM há décadas. Isso
porque defendem que o PSDB seja cabeça de chapa tanto na disputa estadual (com
Alckmin) quanto na disputa presidencial (com João Doria).
No entanto, essa estratégia é ardilosa,
porque muitos acreditam que a polarização entre Lula e
Bolsonaro deixaria João Doria de fora.
Não se sabe ao certo o tamanho dessa oposição. Apoiadores de Doria dizem
que são tucanos em extinção. Já os veteranos alertam que sua história não pode
ser subestimada.
Em outubro de 2019, um jantar em Campos do Jordão (SP) reuniu “uma boa
centena” de apoiadores e prefeitos do PSDB, para “lançar a candidatura de
Alckmin para governador”.
“O interior elegeu Doria, e ele se esqueceu do interior. Geraldo vai ser
nosso candidato. O estado de São Paulo precisa dele”, discursou Tobias sob
aplausos efusivos. Alckmin se limitou a agradecer timidamente e sorrir.
É importante ressaltar que, em outubro de 2019, a pandemia do novo coronavírus não estava no horizonte. João Doria e Jair Bolsonaro não se insultavam publicamente e até partilhavam desejos comuns, como a privatização da Ceagesp. E prefeitos paulistas reclamavam da lentidão de obras, ou reversão de planos, pelo estado.
ABC sem metrô
Uma das obras previstas pela gestão de Geraldo Alckmin, cancelada na gestão de João Doria, era uma linha de monotrilho até a região do Grande ABC, que espera o metrô há 45 anos. “Isso poderia ser relicitado, não tenho detalhes da decisão (do cancelamento), mas é natural que região tão populosa e importante como o Grande ABC tenha ligação pelo sistema metroviário” declarou Geraldo Alckmin em dezembro de 2020, para o Diário do Grande ABC, em uma de suas poucas declarações a jornalistas.
Líderes locais afirmam que a gestão de João Doria tem
falhado no diálogo com a região, gerando uma persistente falta de sintonia para
qualquer assunto. Ainda que o PSDB domine boa parcela das prefeituras da região
metropolitana de São Paulo, os líderes não entram em consenso nem para
articular ações em conjunto para enfrentar a pandemia.
Do mesmo modo que todo o litoral, o Grande ABC
demonstra resistência à Doria desde a eleição, quando a região deu preferência
ao vice de Geraldo Alckmin, o ex-governador Marcio França (PSB) e ex-prefeito
de São Vicente (SP).
Por outro lado, Alckmin falhou quando
governador em outras regiões, que rejeitaram França e apostaram em Doria. Uma
delas foi a de São José de Rio Preto, onde a criação de uma região
metropolitana foi vetada por Geraldo Alckmin, mas abraçada por João Doria em
fevereiro de 2021, após 28 anos.
Trabalhando pela
composição
Entre fevereiro e março de 2021, declarações internas de apoio a Geraldo Alckmin se misturaram com uma crise nacional do PSDB que se tornou pública.
Naqueles meses, uma ala do PSDB, em oposição à Doria, passou a apoiar uma candidatura do governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) para a Presidência. Doria também acumulou desavenças no partido ao pedir a expulsão do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG).
Em âmbito nacional, João Doria e Bruno
Araújo, presidente nacional do PSDB, tentaram desfazer a ideia de falta de
sintonia assinando um artigo intitulado “Princípios do PSDB garantem a união do
partido”.
Já no âmbito estadual, João Doria tem optado por agradar a velha guarda
agregando ao quadro do governo aliados dos veteranos, caso do ex-ministro da
Saúde e ex-prefeito de Piracicaba Barjas Negri (ele acabou sendo barrado por
pendências judiciais).
Com a pandemia, João Doria também melhorou sua relação com vários
municípios, principalmente por conta da atuação de Marco Vinholi, atual
secretário de Desenvolvimento Regional e presidente do PSDB paulista, que
substituiu Pedro Tobias.
Muitos dos ouvidos pelo Metrópoles dizem
que parte do domínio político de Doria sobre o PSDB de São Paulo se deve à
Vinholi, cuja função no governo é negociar com os prefeitos de todo o estado.
Obra atrasada? Faltou verba? Não está feliz com a fase de seu município no
Plano São Paulo? Chama o Vinholi.
Ao Metrópoles, Marco
Vinholi minimiza essa impressão de descompasso entre o PSDB paulista. “O PSDB é
muito grande e com um quadro muito forte em São Paulo. E como é um partido de
militância, não apenas uma sigla, é natural que surjam divergências,
principalmente nas discussões sobre o rumo do partido.”
“Eu não vejo uma desunião do partido, o que eu vejo é um partido que é
vivo, que está sempre em discussão sobre os melhores rumos a tomar e isso é a
tônica da democracia. Isso supera opiniões pessoais. Nossa missão para 2022 é
ter protagonismo e fazer uma boa bancada federal”, declarou o secretário de
Desenvolvimento Regional.
A questão Rodrigo Garcia
O governador João Doria tenta convencer, até publicamente, seu vice,
Rodrigo Garcia, a trocar o DEM pelo PSDB. Isto geraria menos resistência dentro
do partido, já traumatizado com as brigas de 2018, quando o vice de Alckmin, Marcio França (PSB) travou
disputa com João Doria que beirou a baixaria.
Além disso, Rodrigo Garcia passou a
substituir João Doria em duas das três coletivas semanais que o
governador concede no Palácio dos Bandeirantes, visando aumentar sua
visibilidade para os eleitores.
No entanto, Rodrigo Garcia resiste à mudança.
Ele é cria do DEM, filiado ao partido desde a juventude, quando o Democratas
ainda se chamava PFL. Mas caso mude, aliados afirmam que seria uma postura
muito elogiada e valorizada dentro do PSDB. O vice-governador não quis comentar
sua situação.
Se Garcia topar sair governador, e Doria disputar a Presidência,
restaria a um político do peso de Alckmin tentar uma vaga para o senado, mas o
ex-governador não se sente à vontade no mundo legislativo.
A cada visita que Geraldo Alckmin faz a prefeitos tucanos, os rumores de
que ele está confiante em disputar prévias com Garcia para o Palácio dos
Bandeirantes apenas crescem.
Vida fora da política
Logo após a derrota nas eleições
presidenciais de 2018 (Alckmin terminou em quarto lugar, com 4,76% dos votos
válidos), o ex-governador se tornou professor em uma universidade privada.
Aproveitou o tempo para estudar inglês e se formou como acupunturista.
Ainda em 2018, depois das eleições, um acordo de paz foi selado entre Doria e Alckmin em uma cantina italiana nos Jardins. Alckmin brindou com vinho. Doria, com Coca Zero.
Entre abril e maio de 2019, saiu o político Alckmin da presidência do PSDB e entrou médico doutor Geraldo no programa Todo Seu de Ronnie Von, dando dicas de como superar o estresse e a depressão.
“A vida não é só viver, tem que conviver e participar”,
disse o ex-governador, ao visitar o prefeito de Barueri Rubens Furlan (PSDB),
em março, para tomar um cafezinho, oficialmente.