O Ministério Público da
Bahia (MP-BA) denunciou um suposto esquema criminoso envolvendo a gestão do
Hospital Nossa Senhora de Lourdes, no município de Antas, na região agreste do
estado. O médico Lucas Matos do Nascimento, que é o presidente da Associação
Santa Casa Sem Fronteiras, e o auxiliar administrativo Lenivaldo Castro Bomfim
Júnior foram denunciados pelo MP acusados de falsificar internações de
pacientes na unidade, com o objetivo de receber recursos públicos do SUS,
repassados pela Secretária da Saúde da Bahia (Sesab). O caso foi investigado e
provas foram levantadas pela Delegacia de Polícia de Antas.
O MP
denuncia Lucas Nascimento e Lenivaldo Bomfim por falsificação de documentos
públicos, falsidade ideológica qualificada e peculato, uma vez que a
falsificação de guias de internação condicionou ao recebimento de mais recursos
do Sistema Único de Saúde.
Segundo a denúncia, provas testemunhais e
documentais no curso da investigação demonstram que Lucas Nascimento usou o
nome do seu antecessor na gestão no hospital, Aldrovando Felix do Nascimento,
para falsificar documentos de “Autorização de Internamento Hospital (AIH)”.
Conforme informações obtidas pelo Bahia Notícias, Aldrovando é pai de Lucas,
também é médico, tem 82 anos, e não pratica mais medicina devido a problemas de
saúde.
A denúncia destaca que Aldrovando foi
diagnosticado com Alzheimer, tem idade avançada, e não atua como médico
definitivamente desde 2019. “Não mais praticando qualquer atividade médica ou
administrativa em decorrência de seu precário estado de saúde”, ressalta a
peça.
O MP aponta que Lucas Nascimento e
Lenivaldo Bonfim, “em parceria criminosa”, teriam falsificado inúmeras
laudos de internação, de modo que no mês de julho de 2020, mesmo com Aldrovando
Félix Nascimento afastado desde o ano anterior, consta que o médico teria
exercido uma jornada de 74 horas de trabalho. O MP vê na atitude “finalidade de
apropriar-se de verbas públicas”.
Em uma das provas documentais anexadas à
denúncia, a secretária da Saúde de Antas, Maíra Juçara de Matos Nilo,
sinalizaria indícios de irregularidades e solicita uma auditoria no Hospital.
Em um trecho do ofício ela apresenta o argumento de que na escala do mês de
maio de 2020 o nome do médico Aldrovando Félix Nascimento não aparece previsto
como plantonista, mas ainda assim ele é o médico solicitante de mais de 70% das
Autorizações de Internação Hospitalar (AIHs) do mês.
A Delegacia de Polícia de Antas localizou
cerca de 10 pacientes que constavam em documentos de internação que teriam sido
solicitadas pelo médico, mas que não teriam ocorrido. A denúncia aponta que
Lenivaldo Bomfim preencheu todas as Autorizações de Internamento Hospital (AIH)
“de maneira criminosa para consumar o delito de peculato de recursos públicos”.
A investigação mostrou que somente no dia 27
de agosto de 2020, cerca de 42 Autorizações de Internamentos Hospitalar teriam
sido falsificadas pela dupla de denunciados em nome de Aldrovando Félix
Nascimento. Consta nos autos que não foram as únicas AIHs com indícios de
irregularidade.
O entendimento do promotor de Justiça
Gildásio Rizério de Amorim, assinado em 12 de abril de 2021, aponta que os
denunciados tinham o objetivo de bater as metas estabelecidas pela Sesab para
receber integralmente os valores estabelecidos pelo cumprimento de 100% dos
atendimentos aos pacientes Antenses. A conduta de Lucas Nascimento e Lenivaldo
Bomfim teria induzido a Secretaria Estadual de Saúde da Bahia ao erro,
“mediante artificio com declarações falsas”.
O Hospital Nossa Senhora de Lourdes é uma
instituição contratada e conveniada com a Sesab para prestar serviço público,
por isso recebe recursos do SUS.
O gestor do hospital ainda é acusado de usar
nos laudos o nome de um médico que nega já ter trabalhado na unidade. Segundo a
denúncia, Lucas Nascimento teria contratado o o homem como clínico geral e esse
teria feito atendimentos aos pacientes do hospital durante o ano de 2020.
Porém, a investigação da delegacia de Polícia de Antas entrou em contato com o
profissional e ele reconheceu que os dados nos documentos lhe pertencem, mas
afirmou que nunca prestou qualquer tipo de atendimento médico no Hospital Nossa
Senhora de Lourdes e nem em qualquer outro estabelecimento de saúde localizado
na cidade de Antas.
A reportagem do Bahia Notícias entrou em
contato com Lucas Nascimento nesta sexta-feira (30) e o médico justificou que a
denúncia se deu em meio a um mal entendido, que se tratava de um “erro de
datilografia” e que “já foi corrigido”. Segundo ele, a corregedoria da
Secretaria da Saúde esteve na unidade e a situação foi esclarecida.
A Secretaria da Saúde do Estado (Sesab) foi
procurada e informou que, até o momento, não há nenhum processo
administrativo em curso tratando da suposta irregularidade indicada.
Em nota encaminhada ao Bahia Notícias, a
diretoria da Santa Casa Sem Fronteiras afirmou que as acusações são falsas e
possuem motivações políticas no município de Antas. Confira a seguir na
íntegra:
"A Santa Casa Sem Fronteiras,
instituição filantrópica com mais de 40 anos de constituída, por meio de seu
Diretor-Presidente, repudia as falsas acusações elaboradas com finalidades
políticas no município de Antas/BA.
Inicialmente, não se sabe, até o presente
momento, quais são os indícios das supostas ilegalidades mencionadas na
notícia, sobretudo em razão de que a Santa Casa Sem Fronteiras, ou qualquer de
seus representantes, não ter sido notificado acerca de qualquer denúncia.
Por outro lado, não haveria qualquer vantagem
a ser obtida pela “produção de AIHs”, tendo em vista que a necessidade de
cumprimento de metas foi suspensa por Lei Federal e Portaria do Ministério da
Saúde para instituição filantrópicas em todo país em função da pandemia da
Covid 19. Portanto, sobre o tema, não seria necessário para fins de cumprimento
de metas. Ou seja, o suposto “esquema” sequer poderia existir, considerando que
o repasse dos recursos à Santa Casa Sem Fronteiras seria feito de forma
integral, independente da apresentação de qualquer produção.
Nesse contexto, a instituição sequer tem
conhecimento de que foi denunciada pelo Ministério Público do Estado da Bahia,
havendo, contudo, um procedimento que apura ser a Santa Casa Sem Fronteiras
vítima de falsos médicos.
Assim, a entidade aguardará notificação do
MP/BA para se manifestar oportunamente sobre o mérito, e desde já se coloca à
disposição, tendo em vista que é a maior interessada em esclarecer os fatos -
já que está na condição de vítima. Ainda no dia de hoje será encaminhado pedido
de cópia de todo o inquérito, bem como serão disponibilizados os contatos da
presidência e do setor jurídico da instituição."