Um jovem de 22 anos foi preso no último dia 8/1 acusado de
participar do julgamento e da execução do próprio pai no tribunal do crime do Primeiro Comando da Capital (PCC), em Itapecerica da Serra, na região metropolitana de São Paulo.
Segundo a investigação, Guilherme Ferreira de Souza Melo é membro da facção criminosa e denunciou o pai para lideranças do PCC diante da suspeita de que o homem teria abusado sexualmente de uma filha de 14 anos.
O crime ocorreu
no início de setembro de 2022. O corpo de Marco Aurélio de Oliveira Melo, de 44
anos, foi encontrado com sinais de empalamento em um matagal na área rural da
cidade, com orelhas e dentes arrancados e o órgão genital decepado.
Guilherme teria sido o responsável por atrair o pai até o local
do crime, sob a alegação de que eles iriam conversar sobre trabalho. No local,
havia outros membros do PCC aguardando para a emboscada.
De acordo com o
delegado Luis Hellmeister, da Delegacia de Itapecerica da Serra, Marco Aurélio
foi alvo de uma sessão de tortura, com a participação do próprio filho.
“Chama a atenção, além da frieza do filho em entregar o próprio pai, o fato de ele ter ido na execução. Eles torturaram, mutilaram e até empalaram a vítima”, diz Hellmeister.
O delegado afirma que a participação de Guilherme no crime foi
confirmada em uma conversa de WhatsApp entre ele e a mãe, ex-companheira de
Marco Aurélio. Ao repreender o filho pela morte do pai, a mulher diz que
Guilherme pode ter o mesmo destino um dia.
“Vamos ver se
tudo isso é da hora. Se você pode se envolver na morte do seu pai. O PCC foi de
acordo. Também será de acordo em te da um pau, que é o que vc merece por tratar
sua mãe assim [sic]”, afirma ela, em mensagem enviada no dia 13 de setembro de
2022.
“O diálogo que comprova isso. A própria mãe dele apontou”, diz
Luis Hellmeister. “Nessa época, ele já estava se virando no mundo do crime,
tinha muitos contatos no PCC. Então, ele falou para as lideranças, os caras que
comandavam o tribunal do crime, e o pai dele foi julgado”, conclui o delegado.
Guilherme
Ferreira nega as acusações, mas ficou em silêncio em seu interrogatório. Ele se
tornou réu por homicídio triplamente qualificado e ocultação de cadáver.
“As circunstâncias concretas do delito apontam a ausência de freios morais do denunciado, pois teria atraído seu próprio genitor para uma emboscada”, diz o promotor João Augusto de Sanctis Garcia na denúncia, aceita no último dia 31/1 pela 4ª Vara de Itapecerica da Serra.
Criança no tribunal do crime
De acordo com o relatório de
investigação, a adolescente de 14 anos que teria sido abusada sexualmente
participou do julgamento de Marco Aurélio no tribunal do crime. Ela estava
acompanhada da mãe, ex-mulher do suposto agressor assassinado, e do pai, que
teria atuado com Guilherme para atrair o “réu do PCC” à emboscada.
Segundo o delegado Luis Hellmeister, no modelo paralelo de “Justiça” implementado pelo PCC, há um rito semelhante ao adotado pelo Poder Judiciário brasileiro.
“Provavelmente, elas foram levadas até o local para prestarem depoimento como testemunha e vítima dos abusos. É, realmente, um julgamento que eles fazem no mundo marginal”, afirma. Não se sabe se a adolescente e seus pais assistiram à tortura e à execução do “réu”.
Tabuleiro do PCC
O tribunal do
crime do PCC, também conhecido como “tabuleiro do PCC”, foi
instituído pela facção no início dos anos 2000 por Marco Willians Herbas
Camacho, o Marcola, apontado como líder máximo do PCC, quando ele criou o setor
de “disciplinas” dentro da facção.
Inicialmente,
os tabuleiros tinham o objetivo de punir eventuais “desvios de conduta” ou
violações ao estatuto interno do PCC por membros da facção criminosa paulista.
Nos últimos anos, no entanto, a “Justiça” paralela implantada pelo comando
passou também a “solucionar” demandas criminais e morais nas periferias das
cidades.
A facção criminosa paulista realiza seus julgamentos intimando os acusados a prestarem satisfação e ouvindo testemunhas. Após avaliar os depoimentos e as provas coletadas, o tribunal do PCC chega a um veredicto. Na maioria das vezes, é aplicada a pena de morte.