Líderes dos partidos da base
governista no Congresso dizem não ter uma agenda de prioridades para 2022, o
que representa forte sinal de que o Palácio do Planalto já deixou em segundo
plano interesses no Legislativo para concentrar esforços na tentativa de
reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL).
A última medida significativa
aprovada foi a PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, que
abre espaço para o Auxílio Brasil de R$ 400.
O novo programa turbinado, que
substituiu o Bolsa Família —uma marca de gestões petistas—, é tratado por
palacianos como mecanismo essencial para tentar reverter a alta rejeição de
Bolsonaro e fazer com que ele melhore o desempenho nas pesquisas eleitorais.
Políticos falam, de um modo geral,
que a ideia agora é encerrar o ano com a aprovação do Orçamento federal de 2022
e, no próximo ano, tocar a bola de lado com votações de menor monta.
Assim como no Palácio do Planalto, o
foco na Câmara e em parte do Senado é a tentativa de reeleição dos próprios
congressistas.
Em todo ano eleitoral, é comum o
Congresso se esvaziar. É o chamado “recesso branco”, que ocorre quando os
parlamentares vão para as bases cuidar de campanhas. O movimento, contudo, se
dá de forma mais comum no segundo semestre do ano eleitoral. Desta vez, a
corrida foi antecipada.
Só do fim de outubro até agora cinco
pré-candidatos à Presidência fizeram eventos em Brasília com caráter claramente
eleitoral, com vista à disputa do ano que vem: Rodrigo Pacheco (PSD), Sergio
Moro (Podemos), Bolsonaro, Simone Tebet (MDB) e João Doria (PSDB).
Os tucanos também escolheram a
capital do país como palco das prévias em que o governador de São Paulo foi
escolhido como o nome da legenda para disputar o Planalto em 2022.
No fim do mês passado, a Folha
mostrou que o ministro Paulo Guedes (Economia) e equipe ainda tinham esperança
de emplacar parte de um minipacote de propostas para tentar reverter ou reduzir
a rejeição de Bolsonaro.
Estavam na lista o texto que permite
abertura de conta em dólar no Brasil, já enviado para sanção de Bolsonaro, e o
projeto que cria a BR do Mar.
Outras propostas mais audaciosas e que faziam parte da agenda liberal de
Guedes, como as reformas tributária e administrativa e a privatização dos
Correios, devem ficar na gaveta, porém.
Apesar disso, em almoço na
sexta-feira (10), Guedes pediu ajuda a empresários para aprovar a reforma
administrativa no Congresso, como mostrou o Painel.
No encontro da Esfera Brasil, grupo
de reúne empresários, o ministro defendeu que a proposta não fará Bolsonaro
perder votos, mas, sim, ajudará a atrair eleitores. Também reclamou de projetos
estagnados no Senado, presidido por Pacheco.
Líder do PP, o partido que comanda a
coalizão bolsonarista na Câmara, o deputado Cacá Leão (BA) disse que a Câmara
terá de montar um conjunto de propostas até abril ou maio, mas não soube dar
mais do que um exemplo.
“A gente vai ter que fazer [votações]
até abril e maio senão é ruim até para a gente. Na cabeça não veio, não [nenhum
exemplo], mas sei que tem uma porrada de matéria, tem o projeto das fake news
[concluído na semana passada no grupo de trabalho na Casa], tem uma porrada de
coisa que está em fase conclusiva”, afirmou.
Líder do governo na Câmara, o
deputado Ricardo Barros (PP-PR) também é lacônico. Por meio de mensagens de
texto, afirmou que a Câmara vai “avançar nas questões de Estado”, que “não
envolvem a disputa eleitoral”, mas não deu exemplos.
Nos bastidores, congressistas
disseram ter recebido até de ministros palacianos a indicação, há alguns meses,
de que o governo “virou a chave” em relação às prioridades: da pauta do
Congresso para a pauta eleitoral.
Líder do PSB na Câmara, o deputado
Danilo Cabral (PE) afirmou ser importante votar no primeiro semestre do próximo
ano algumas pautas que não puderam ser deliberadas neste ano, entre elas
algumas que envolvem proteção social.
“Existe aí uma expectativa de que a
gente vá ter um aprofundamento da crise e o aumento da vulnerabilidade, com uma
economia com perspectiva de estagnação”, disse.
“Nós precisamos garantir que o
auxílio emergencial [Auxílio Brasil], que, na forma como foi apresentada pelo
governo, tem prazo para término em 31 de dezembro de 2022, seja discutido e
aprovado e instituído como renda básica permanente, da mesma forma que era o
Bolsa Família”, afirmou Cabral.
O deputado também citou a reforma tributária
como outro texto importante que precisaria ser analisado no próximo ano, mas
reconhece que a proximidade da eleição contamina o debate e inviabiliza a
discussão. “Você não consegue avançar, tendo em vista a complexidade do tema em
um ano eleitoral.”
Já a reforma administrativa perdeu as
condições políticas de avançar em 2022, disse Cabral.
O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) vê
apenas projetos de menor relevância sendo votados no próximo ano. “Nada da
agenda do governo deve avançar”, disse.
Segundo ele, a antecipação deste
clima de eleição ocorre porque o governo já está sem agenda há algum tempo,
pensando somente em questões eleitorais.
“De agenda, de reformas, de coisas
mais relevantes, o governo já desistiu. O próprio presidente já está mais preocupado
em ter um rol de partidos mais amplo para disputar a eleição do que em aprovar
alguma coisa no Congresso”, disse Kataguiri.
Ranier
Bragon e Danielle Brant / Folha de São Paulo