O governo Jair Bolsonaro passou a defender abertamente a
ampliação da CPI da Covid. Com a medida, a comissão no Senado poderia
investigar também a ação de governadores e prefeitos na pandemia.
A estratégia, segundo
senadores e auxiliares de Bolsonaro, é jogar mais pressão sobre congressistas
para que eles retirem assinaturas do pedido de criação da comissão. Isso
precisa ser feito nas próximas horas.
O Palácio do Planalto avalia que a perspectiva de uma CPI que,
além do governo federal, mire prefeitos e governadores pode ser suficiente para
reduzir os apoios à instalação da CPI no Senado, uma vez que senadores são
ligados politicamente às administrações nos estados.
No sábado (10), Bolsonaro defendeu a extensão do escopo do
colegiado.
"A CPI [é] para apurar
omissões do presidente Jair Bolsonaro, isso que está na ementa. Toda CPI tem de
ter um objeto definido. Não pode, por exemplo, por essa CPI que está lá, você
investigar prefeitos e governadores, onde alguns desviaram recursos. Eu mandei
recursos para lá, e eu sou responsável?", disse.
"Conversei com alguns [senadores] e a ideia é investigar
todo mundo, sem problema nenhum", afirmou Bolsonaro que, na manhã do
sábado, realizou um passeio de moto pela periferia de Brasília.
Depois, em áudio divulgado pelo senador Jorge Kajuru
(Cidadania-GO) neste domingo (11), Bolsonaro voltou a apelar para a ampliação
da CPI.
"Se não mudar, a CPI vai simplesmente ouvir o [ex-ministro
da Saúde, Eduardo] Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório
sacana", disse Bolsonaro, em gravação reproduzida nas redes sociais do
senador.
O discurso foi endossado pelo ministro das Comunicações, Fábio
Faria (PSD), em uma sequência de mensagens publicadas no Twitter sábado (10) e
domingo (11).
"Uma CPI exclusivamente para apurar o governo federal eu
sou totalmente contra. Se tiver CPI, que se apure todos os entes da Federação,
inclua estados e municípios e os impactos da liberação da eleição de 2020 para
o surgimento da nova cepa (P.1)", escreveu.
Um primeiro passo para a instalação da CPI para investigar as
ações e omissões do governo federal no combate ao coronavírus deve ocorrer
nesta terça-feira (13), com a leitura do requerimento da comissão pelo
presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
Mesmo com as assinaturas necessárias, Pacheco vinha bloqueando a
criação do colegiado. Segundo ele, o momento não é adequado para investigação
parlamentar com potencial de trazer forte instabilidade na política nacional.
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal
Federal), no entanto, determinou que a CPI fosse instalada. A decisão liminar
(provisória) é de quinta-feira (8).
Inicialmente, a ordem do ministro seria analisada no plenário
virtual da corte, no qual são depositados os votos, sem debates. No sábado,
Luiz Fux, presidente do STF, após consulta aos ministros, antecipou o
julgamento para esta quarta (14), que será no plenário físico da Corte.
Na manhã desta segunda (12), Bolsonaro escreveu em suas redes
sociais que "nos momentos difíceis deve-se unir forças, nunca ofender exatamente
aquele que pode ser decisivo nesse salvamento".
"Convença aqueles que estão ao seu lado a defender a
Constituição, em especial seu art. 5°, a nossa bandeira verde e amarela",
disse. "Cada vez mais a população está ficando sem emprego, renda e meios
de sobrevivência, o caos bate na porta dos brasileiros. Pergunte o que cada um
de nós poderá fazer pelo Brasil e sua liberdade e prepare-se", afirmou.
Agora, a principal frente de ação do Palácio do Planalto é
tentar conseguir que assinaturas sejam retiradas por senadores até esta
terça-feira. Dos 81 senadores, 32 assinaram o pedido de CPI -são necessários
27.
A ameaça de uma CPI com potencial de criar problemas para
governadores é considerado um argumento importante para o Planalto, que mira
principalmente congressistas ligados a governos estaduais.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) pediu que as
apurações envolvam também os gestores locais.
"Dessa forma, não cabe, a nosso ver, instituir uma comissão
parlamentar de inquérito para proceder à investigação da atuação dos órgãos
estatais diante da pandemia do Covid-19 e limitar o seu escopo exclusivamente
aos agentes públicos federais. Trata-se de um sistema nacional e assim deve ser
avaliado", escreveu Vieira.
O requerimento dele foi apresentado à Secretaria-Geral da Casa
no sábado. Após a instalação da CPI, basta a maioria simples para a aprovação
desse pedido de ampliação do escopo da comissão.
Essa possível ampliação do escopo da investigação interessa ao
Planalto mesmo se a estratégia de tentar a retirada das assinaturas não surtir
efeito.
Se a CPI sair do papel, o Planalto considera que pode equilibrar
o desgaste da investigação contra os atos de Bolsonaro com o discurso adotado
há meses pelo presidente: o de que estados e municípios receberam vultosos
recursos da União para combater o vírus, mas não só falharam em conter a doença
como muitos teriam praticado desvios e ilícitos.
Congressistas que apoiam a CPI, no entanto, dizem que as
declarações de Bolsonaro não devem ser suficientes para reverter assinaturas e
que o presidente está, novamente, tentando mobilizar sua base.
De acordo com eles, o pedido original da CPI já era amplo o
bastante para apurar o uso de dinheiro federal no combate à pandemia, o que
obviamente abarcaria administrações locais que tivessem usado esses recursos.
Mesmo com a formalização da CPI, senadores estão céticos quanto
à possibilidade de a comissão efetivamente funcionar. Congressistas dizem que o
colegiado não tem condições de trabalhar sem as mínimas garantias sanitárias,
uma vez que as reuniões de CPI ocorrem em salas fechadas e com reduzida circulação
de ar.
De acordo com senadores, é inviável colher depoimentos de forma
remota. Mesmo se houver sessões presenciais, eles afirmam que qualquer
testemunha poderia alegar motivos médicos para não comparecer. Além do mais,
parlamentares dizem que uma CPI que funcione remotamente impossibilita a
análise de documentos sigilosos.
A percepção de que a CPI não tem no momento condições de
funcionar é partilhada tanto por apoiadores de Bolsonaro quanto por alguns
parlamentares da oposição. Três senadores morreram de Covid: Arolde de Oliveira
(PSD-RJ), José Maranhão (MDB-PB) e Major Olímpio (PSL-SP).
NOVA CPI
Também nesta segunda-feira
(12), o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) informou que conseguiu as
assinaturas necessárias para uma outra Comissão Parlamentar de Inquérito no
Senado Federal, para já incluir no escopo das investigações também estados e
municípios.
O senador é um aliado do
presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que vem adotando a estratégia de
buscar investigar também estados e municípios, para tirar o foco exclusivo de
seu governo.
O requerimento do senador foi apresentado em março, mas ganhou
grande velocidade na adesão de assinaturas a partir de sexta-feira (9), após a
decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que determinou a abertura da CPI da
Covid no Senado.
"Conseguimos! Já são mais de 34 assinaturas até o
momento", escreveu Eduardo Girão, em suas redes sociais. São necessárias
27 assinaturas, equivalente a um terço do Senado, para a instalação de uma
comissão parlamentar de inquérito.
"Reunimos o número de assinaturas suficientes para
protocolar uma CPI abrangendo União, estados e municípios. Espero que a verdade
venha à tona, quem tá devendo vai ter que se justificar e quem errou vai ter
que ser punido", completou.
Na quinta-feira (8), o ministro do STF Luís Roberto Barroso
proferiu decisão monocrática na qual obriga o Senado a instalar a CPI da Covid.
O requerimento para a instalação de uma CPI estava há dois meses
parado com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que defendia não
haver condições físicas e sanitárias para instalar a comissão, por conta da
pandemia, e também por acreditar que ela atrapalharia as ações de enfrentamento
à Covid.
Pacheco afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que iria cumprir a
decisão e que leria o requerimento de instalação na sessão de terça-feira (13).
Um indicativo que a nova CPI pode beneficiar o governo do
presidente Bolsonaro é a presença de assinaturas de bancadas governistas e
mesmo líderes do governo no requerimento. Assinam, por exemplo, os líderes do
governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), e no Congresso, Eduardo Gomes
(MDB-TO).
A lista também conta com assinaturas de bancadas consideradas
governistas, como DEM, PSD e PP.
O senador Álvaro Dias (Podemos-PR) afirmou que vai solicitar que as duas propostas de CPI sejam apensadas, o que significaria unificar os dois pedidos de instalação de comissão.
O governo começou a agir desde o fim da semana passada contra a CPI da Covid, autorizada por Barroso. A primeira estratégia foi pressionar pela retirada das assinaturas, inviabilizando a sua criação antes mesmo da instalação. No entanto, o número de assinaturas cresceu nesta segunda-feira, com a adesão de Chico Rodrigues (DEM-RR) e Flávio Arns (Podemos-PR).