Nenhum congressista
apresentou uma emenda pedindo que o fundo eleitoral para 2022 tivesse o aumento
bilionário aprovado pelo Congresso às pressas na semana passada.
A
mudança no texto foi feita diretamente pelo relator da proposta, Juscelino
Filho (DEM-MA), a quem coube a função de operador das negociações partidárias
que ocorreram nos bastidores. A estratégia de não apresentar uma emenda ao
texto teve o objetivo de não deixar registros da movimentação.
No
relatório, Juscelino Filho não detalhou o expressivo aumento da verba.
"Ademais, aperfeiçoamos os parâmetros definidores do Fundo Especial de
Financiamento de Campanha", limitou-se a escrever.
Foi
apenas no meio de 176 artigos, além de 8 anexos, em um relatório de 521
páginas, que entrou o trecho prevendo um cálculo mínimo para o fundão. A conta de
R$ 5,7 bilhões teve de ser feita por técnicos do Congresso, pois o texto não
expõe o valor exato.
Procurado,
Juscelino Filho não quis comentar sobre o processo para inflar o fundo nem o
motivo para incluir tal medida no relatório.
O presidente
Jair Bolsonaro (sem partido) agora promete vetar a expansão bilionária dos
recursos para a campanha em 2022. Nas eleições de 2018 e de 2020, a verba ficou
em torno de R$ 2 bilhões.
Interlocutores
do Palácio do Planalto passaram a negociar com caciques partidários para que o
fundo fique próximo de R$ 4 bilhões. Alguns querem mais —algo como R$ 4,5
bilhões. O argumento é que a campanha nacional e nos estados em 2018 foi muito
enxuta.
Foram
apresentadas mais de 2.600 emendas na CMO, comissão de deputados e senadores
que analisa questões orçamentárias.
Nesse
total, havia a emenda do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), que tratava
especificamente do fundo eleitoral. O objetivo era limitar o valor do fundão ao
de 2020, corrigido pela inflação. A proposta não foi acatada pelo relator.
Em
vez disso, Juscelino Filho acrescentou um dispositivo que indica que o fundo
eleitoral será financiado com parte das emendas de bancada estadual e 25% da
verba da Justiça Eleitoral em 2021 e 2022. Isso resulta nos R$ 5,7 bilhões.
Segundo
técnicos do Congresso, é permitido que o relator faça esse tipo de alteração
direto no parecer, sem a necessidade de uso de uma emenda previamente
apresentada ao projeto.
No
entanto, é comum que temas de interesse dos parlamentares sejam concretizados
em uma sugestão de mudança ao texto. Isso facilita a negociação e abre a
possibilidade de pedir uma votação específica para incluir o trecho, mesmo se o
relator não acatar a emenda.
Nesse
caso do fundão eleitoral, não foi necessário. O acordo partidário, envolvendo
siglas de diversas alas políticas, foi feito às vésperas da votação de
quinta-feira (15).
Para
tentar garantir um valor mais alto do que nas eleições anteriores, o Congresso
já incluiu no projeto da LDO (lei que dá as bases do Orçamento) de 2022 uma
previsão do piso mínimo para essa despesa.
Assim,
o Orçamento, que só será encaminhado no fim de agosto pelo governo, teria de
considerar o patamar de R$ 5,7 bilhões.
A
versão da proposta de LDO com a expansão do fundo eleitoral foi apresentada na
madrugada de quinta-feira e, no mesmo dia à noite, já havia completado toda a
tramitação no Congresso. Isso inclui a comissão responsável por assuntos
orçamentários, votação na Câmara e no Senado.
Bolsonaro
diz que vetará esse trecho sobre o valor inflado para o financiamento de
campanha. Caciques partidários querem evitar o confronto e a derrubada do veto.
Isso ampliaria o desgaste do Congresso, criticado nas redes sociais pela
votação.
Por
isso, a saída apontada é uma negociação política por um patamar mais baixo. A
equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) defende algo próximo dos R$ 2
bilhões gastos nas campanhas eleitorais anteriores. A proposta não agrada a
líderes partidários.
Se
o valor não mudar, a aprovação dos R$ 5,7 bilhões para o fundo eleitoral não só
elevará o país ao topo do ranking de uso de dinheiro público nas campanhas como
possibilitará um gasto médio de mais de R$ 250 mil por candidato nas eleições
do próximo ano.
O
valor representa a divisão da verba pública total prevista —R$ 5,7 bilhões do
fundo eleitoral, mais R$ 972 milhões do fundo partidário—, dividido pelos cerca
de 26 mil candidatos que foram lançados pelos partidos na eleição de 2018.
Na
segunda-feira (19), Bolsonaro qualificou o valor do fundão como
"astronômico". "Mais R$ 6 bilhões para fazer campanha eleitoral.
Imagine na mão do ministro [da Infraestrutura] Tarcísio [de Freitas] o que
poderia ser feito com esse dinheiro", disse.
"Se
esse recurso vai para a mão do [ministro] Rogério Marinho, do Desenvolvimento
Regional, você pode concluir as obras de água para o Nordeste."
Na
LDO de 2020, que contemplava verba para eleições municipais, o então relator,
deputado Cacá Leão (PP-BA), inicialmente tentou dobrar os recursos para o
fundo, ao incluir no projeto autorização para destinar até 0,44% da receita
corrente líquida ao instrumento de financiamento de campanhas.
O
valor sairia de R$ 2 bilhões para cerca de R$ 3,7 bilhões. No entanto, o forte
desgaste político gerado fez com que recuasse e mantivesse o valor próximo de
R$ 2 bilhões.
Na
época, Bolsonaro sinalizou que vetaria o fundo eleitoral, mas recuou e acabou
dando aval, argumentando que, do contrário, poderia ser alvo de um processo de
impeachment.
O
fundo eleitoral é uma criação recente. Até 2015, grandes empresas, como bancos
e empreiteiras, eram as principais responsáveis pelo financiamento dos
candidatos.
Naquele
ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu a doação empresarial sob o
argumento de que o poder econômico desequilibra o jogo democrático.
Para
as eleições de 2018 foi criado então o fundo eleitoral, de R$ 1,7 bilhão, que
se somou aos recursos já existentes do fundo partidário, em torno de R$ 1
bilhão.